Moro & Dallagnol, pas de deux fora na ilicitude |
Moro não poderia ter "trocado figurinhas" com Dallagnol. O procurador é custos legis (fiscal da lei) ao receber os autos. Ao decidir pelo oferecimento da denúncia, ele passa a ser parte. Ele é o Estado contra alguém. Parte da lide, o juiz só pode falar com ele na presença da outra parte (o advogado de defesa) e vice-versa.
Invertamos a posição. E se Moro chamasse os advogados de Lula, sem o conhecimento do procurador, para falar de como deveriam proceder no caso, de molde a "salvar" o seu paciente?
Moro sabia o terreno em que estava pisando. Tinha em mãos o Código de Processo Penal, cujo artigo 254 determina que o juiz deve se declarar suspeito (ou poderá fazê-lo um dos litigantes), "se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles" e também "se tiver aconselhado qualquer das partes".
Também conhece o ditame do artigo 145, Código de Processo Civil, que determina as normas de processos civis no país e, subsidiariamente, aplica-se aos processos penais: há suspeição do juiz, quando ele der conselhos a alguma das partes.
E temos a Constituição, a Lei das Leis, que assegura a ampla defesa e o contraditório, exigindo que haja paridade entre quem defende e quem acusa. O tratamento diferenciado materializa a ilegalidade.
O deus ápode tombou. Até então impoluto, Sérgio Moro caiu, sim, no grave erro. A quem tanto quis prender pode acabar soltando. O que é triste: contribui para a desmoralização do Poder Judiciário, que já está sem moral alguma (que o digam alguns tartufos do STF).
A Dallagnol cabe o artigo 3º do Código de Ética do Ministério Público: o trabalho tem de ser realizado de maneira imparcial, "não permitindo que convicções de ordem político-partidária, religiosa ou ideológica afetem sua isenção". A vedação é cimentada pelo 1º artigo do 4º capítulo, que estabelece como compromissos éticos "atender demandas de modo imparcial" e proíbe "qualquer atitude que favoreça indevidamente alguma parte".
No caso de Lula — o mais evidente até o momento —, cabe a anulação do processo, se provado que o ex-juiz, além de condená-lo, também contribuiu com a acusação. As provas publicadas do tal conluio não são lícitas - é o argumento. E, realmente, não são, mas Isso não impede que sejam usadas em questionamentos éticos, envolvendo o juiz e o procurador. Tal invalidade, contudo, não trará de volta a imagem limpa do até então aclamado paladino da lei, da moral e dos bons costumes.
P. S. - Não se tenta aqui de defesa à absolvição de quem quer que seja (lugar de bandido é na cadeia), mas apenas colocar, acima de tudo e de todos, o devido processo legal, princípio basilar do chamado Estado Democrático de Direito.
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